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  • Foto do escritorMestre Guto Lemos

Debate sobre DSTs no sexo sadomasoquista no Museu da Diversidade no dia mundial do BDSM, 24/7.


https://paulosampaio.blogosfera.uol.com.br/2017/07/24/governo-patrocina-debate-sobre-doencas-sexualmente-transmissiveis-no-sexo-sadomasoquista/

Governo de SP patrocina debate sobre DSTs no sexo sadomasoquista

Paulo Sampaio

24/07/2017 18h46

Passava das 18h de sábado quando uma morena esguia, o corpo sinuoso dentro de um vestido preto justo com aberturas nas laterais, usando botas de verniz até os joelhos e jaqueta de couro cravejada de spikes desceu correndo as escadarias da estação República do metrô e entrou no Museu da Diversidade, onde um grupo de praticantes do sexo sadomasoquista a aguardava ansiosamente. “Desculpe, gente, eu estava atendendo um escravo”, justificou Morgana Marone, 39 anos, a Rainha Morgana, que há 20 trabalha como “dominadora profissional”. Ela foi uma das mediadoras da mesa redonda que o governo de São Paulo patrocinou no último fim de semana para debater sobre “Cuidados com a Saúde na Prática do BDSM (bondage, disciplina, dominação, submissão, sadismo e masoquismo)”.

Participaram também a epidemiologista Naila Santos, do Centro de Referência e Treinamento – Doenças Sexualmente Transmissíveis DST/Aids, da Secretaria da Saúde; o médico legista Dom PC, que é dominador; e o Mr. Leather Brasil, campeão de um concurso disputado entre homens que vestem couro na hora do sexo. Trinta e duas pessoas compareceram ao debate, a grande maioria envolvida com a prática sadomasoquista.

Rainha Morgana explica que atender um escravo, no caso dela, é cobrar para prestar o serviço de dominá-lo por um período de tempo estabelecido. A expertise dela é humilhar física e emocionalmente o parceiro. Ela amarra, prende com algemas, chicoteia, espanca, pisoteia, dá ordens e castiga caso o serviço esteja malfeito. “Quando me indagam de que prática eu gosto, eu respondo que é melhor me perguntarem qual eu não gosto.” Sim, ela tem seus limites. Avisa aos clientes, por exemplo, que não faz o chamado “banho marrom”, quando submisso pede que o dominador evacue sobre ele. “Não gosto de scat”, diz ela, usando a forma reduzida da palavra escatologia.

Alguém aproveita para perguntar à médica Naila Santos sobre as doenças que o “scat” pode transmitir. Ela diz que existe o risco de contrair a hepatite A, cuja transmissão é oral-fecal. “Na criança, a hepatite A é benigna. No adulto, pode matar”, ela explica. Em relação à “chuva dourada”, como é chamado no meio BDSM o banho e/ou ingestão de urina, nada ou quase nada pode acontecer. “A urina é um líquido estéril. Não oferece risco nenhum”, diz a médica.

Mr. Leather levanta uma questão: “Eu tenho histórico de cálculo renal, então pode haver sangue na minha urina. Se alguém a ingere, é perigoso?” A médica diz que teria de haver muito sangue para oferecer perigo.

Dom PC propõe um upgrade para a manipulação anal. Pequenas lesões provocadas pela penetração de dedos ou objetos (cabo do chicote, bastões, vibradores) podem representar riscos? Sim, diz a médica. O vírus da Hepatite A é resistente, pode permanecer no objeto. O vírus do HIV não sobrevive em contato com o meio ambiente. Não sobrevive ao contato com o ar. Cogita-se a higienização com álcool gel, e então Mr. Leather diz que leu a respeito. “Não é suficiente”. Um dos participantes fala em usar uma solução de água com (em quantidade mínima) água sanitária. Naila ri e diz que a água sanitária definitivamente não é o ideal para se limpar o objeto, muito menos para colocar em contato com a mucosa anal.

Ela diz que o perigo maior que ela vê na introdução de objetos no ânus é não conseguir resgatá-los. “Acontece muito de eles entrarem e se perderem, aí fica complicado.”

O estilista e empresário de festas sadomasoquistas Heitor Werneck, que criou a mesa redonda, pergunta sobre suor e lágrima: “Posso lamber alguém suado à vontade? Tô deixando de lamber por medo”. A doutora informa que sim: “É quase impossível se transmitir o vírus da Aids pela saliva ou suor. Não há registros na literatura médica sobre isso.”

Segue-se falando de herpes e HPV. “Usar cueca do outro é perigoso?”, pergunta Werneck. “Gosto também de roçar na bunda do companheiro: tem risco?” Naila diz que tem uma “péssima notícia”. “Herpes e HPV são dois bichinhos chatos. Para pegar, basta o contato de lesão com lesão.”

E amarrações com corda (o famigerado bondage, imobilização do parceiro). “Se a corda roça no ânus, ou na vagina, e causa lesões, há perigo de transmissão de vírus pelo sangue (caso a corda entre em contato com alguma lesão na mucosa do dominador)?”, perguntam. “Gente, pelo amor de Deus, joga a corda fora”, reage Rainha Morgana. “Corda é tão barato. Na 25 (de março) tem uma loja que vende com um preço ótimo. Compro as minhas lá.” Por via das dúvidas, a doutora informa que, de novo, embora o sangue seja sempre o vilão, é preciso uma quantidade razoável para haver transmissão.

A última abordagem diz respeito a uma velha crença do escravo, segundo a qual a responsabilidade de qualquer doença transmitida durante prática BDSM é do dominador. “Muitos raciocinam assim: como o dominador controla a relação, ele deve cuidar para que tudo seja feito dentro da maior segurança. Não é assim. Os dois devem assumir juntos o que possa vir a acontecer”, afirmam os dominadores presentes. Mr Leather diz que, para evitar esse tipo de situação, a primeira prova a que ele submete o escravo é responder a um “formulário” dizendo de que doenças ele é portador. Detalhe importante. O percentual de submissos declarados na sala, com boa vontade, não ultrapassava os 30%.

Entre eles, o autônomo Marcelo do Prado, 42, que passa todo o encontro segurando a bolsa de sua dominadora, Francini Zanqui, 38, que tem um programa sobre BDSM em uma rádio de Sorocaba, cidade a 87km de São Paulo. “Ele (Prado) cuida da minha casa, realiza as tarefas domésticas, e depois eu o espanco com um chicote.” Ela conta que o submete à chuva dourada, e ele fica de quatro para fazer a chamada “pet play”, agindo como um cachorrinho.

O encontro termina por volta das 20h. No dia seguinte, quando o blog pergunta a Heitor Werneck se pode obter o registro fotográfico do evento, para publicá-lo, ele informa que a fotógrafa e cinegrafista foi assaltada na estação do metrô e que levaram sua câmera. Trata-se de uma prática de violência (não consentida) a que o governo pode prestar tanta atenção quanto a do BDSM.

Para ler essa matéria no blog original do autor Paulo Sampaio, basta clicar em cima da foto abaixo.

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